terça-feira, 6 de outubro de 2009

Miúdos Bombeiros Tansportam Cadáveres

O primeiro serviço ainda está fresco na memória. Ricardo Pimenta tinha 15 anos e estava de piquete no quartel dos Bombeiros Voluntários do Sul e Sueste. Tinham sido chamados para a remoção de um cadáver de alguém que tinha morrido em casa. Quando lá chegaram, viram "uma senhora caída com a massa encefálica à mostra. A polícia disse que já devia estar morta há quatro dias".
Ricardo conta o episódio num tom natural, sem inflexões. A distância temporal assim o permite. Passou mais de um ano desde esse "primeiro serviço". Agora estas situações "já não impressionam tanto", sussurra, esboçando um sorriso na cara imberbe. Conta que até brinca com uma colega sobre quem mais mortos recolheu. Mas na realidade, não foram tantos assim. Desde que deixou só de tocar caixa na fanfarra e passou a integrar o grupo de cadetes do quartel fez "apenas" quatro transportes para a morgue.
(Ricardo e Fabian, 16 e 17 anos, dos Bombeiros Voluntários do Sul e Sueste contaram-nos que já transportaram doentes do hospital para a morgue. Às vezes, fazem piquetes de 24h ao fim-de-semana.)
Este não é o tipo de serviço que agrade ao amigo e companheiro de aventuras, Fabian Raposo Diaz. Aos 17 anos, Fabian troca facilmente o clarim da fanfarra pela actividade operacional dos bombeiros, mas dispensa os que impliquem transporte de cadáveres. No único que diz ter feito, passou o tempo todo a trocar mensagens com a mãe via telemóvel, procurando "apoio moral". É a própria mãe, Maria, que nos relata que para o acalmar lhe dizia: "Lembra-te que a pessoa já faleceu e não te vai fazer mal". Orgulhosa do seu petiz, deixa um conselho: "Deixemos os nossos filhos aprenderem com a realidade da vida".
Ricardo e Fabian são adolescentes voluntariosos, mas sem a clara noção de que para "ajudar os outros" estão a violar a lei. Como eles, um pouco por todo o país há menores de idade a participar em operações que lhes são interditadas.
Desde Junho de 2007 que "é vedado o exercício de actividade operacional" aos infantes e cadetes dos bombeiros. Ou seja, estão proibidos de transportar doentes para uma consulta ou um tratamento hospitalar, de irem buscar pessoas que morreram em casa, deslocarem-se a uma situação de emergência ou ajudarem no combate aos fogos, mesmo como figuras de segunda linha.
(Ana, à esquerda e Sílvia, no centro, de 13 e 17 anos, dos BV do Fundão, já acudiram a emergências, e a mais nova não esquece uma situação em que uma senhora lhe desmaiou nos braços.)
Eles reagem de imediato: "Acha que gostaríamos de chegar ao quartel e ficar sempre em terra?", questiona Fabian. "É a ajudar os socorristas nos acidentes que aprendemos mais", garante Ricardo, argumentando que até já frequentaram cursos de socorrismo, mas não têm idade para fazer o exame.
O comandante dos BV do Sul e Sueste, António Reis, defende-se de responsabilidades quanto à operacionalidade dos seus nove cadetes: "Se saíram para emergências foi à revelia. Pela calada da noite enfiam-se nas ambulâncias". Admite apenas que eles fazem "serviço de rotina de transporte de idosos para o hospital" e que "por vezes acabam por apanhá-los mortos em casa". Por seu lado, os dois adolescente defendem o comandante com unhas e dentes como "responsável" e "sempre atento".
É assim com todos os menores contactados pelo Expresso. Sérgio e Marcos (ambos com 15 anos), infantes dos BV do Dafundo também defendem o seu comandante, ao mesmo tempo que dizem que "sem a adrenalina, perdia o interesse". O comandante deles, Carlos Jaime, não compreende porque é que "nos bombeiros só podem levar uma pessoa ao hospital a partir dos 18, se o direito ao trabalho existe a partir dos 16 e podem ir para a tropa aos 17".
Para estes jovens a experiência é uma aprendizagem. "Crescemos como homens", sublinha Sérgio, cujo sonho é apagar fogos. O serviço mais emocionante que teve até agora foi o de ajudar a evacuar os doentes do Hospital S. Francisco Xavier na sequência de um incêndio. O amigo Marcos, não esquece a aflição que sentiu por não terem chegado a tempo ao socorro a uma menina de seis anos que se tinha cortado nos pulsos. "Impressionou-me pela aflição do motorista da ambulância e dos vizinhos".
"Nestas idades, os mecanismos de reacção à adversidade ou a capacidade de compreensão não são as mesmas que as de um adulto", explica Jorge Silva, psicólogo e bombeiro voluntário. O psicólogo desconhece qualquer situação de um adolescente traumatizado, mas acha que "não devemos colocar menores ao serviço da comunidade". E sublinha: "Um miúdo de 13 ou 15 anos estará sempre mais vulnerável do que um adulto".
Protecção Civil desconhece casos
Questionada pelo Expresso sobre os casos de violação à lei, a Autoridade Nacional de Protecção Civil (ANPC) esclarece que, desde que a lei entrou em vigor, "não recebeu quaisquer denúncias, nem foram detectadas quaisquer situações anómalas". E que, "se o comando distrital tivesse conhecimento de situações, seriam de imediato tomadas as medidas adequadas ao esclarecimento dos factos e respectivo procedimento, junto de quem tem a responsabilidade de zelar pelo cumprimento e aplicação da legislação".
(Marcos e Sérgio, dos BV do Dafundo, ambos de 15 anos, dizem que a actividade dos bombeiros os faz «crescer como homens». Transportam doentes e participam em emergências.)
Na realidade, alguns comandantes de corporações com quem falámos e que admitem abertamente que rapazes ou raparigas de 15, 16 ou 17 anos são terceiros elementos no transporte de doentes, parecem ignorar que esta actividade é uma das interditadas aos menores. Por exemplo, o comandante António Antunes, dos BV do Fundão, fala com naturalidade sobre apoio de segunda linha feito por cadetes com curso de socorrismo no transporte de doentes, "numa situação em que não tenha mais ninguém à mão". Mas garante que não envia nenhum para uma emergência: "Não os quero em stresse", justifica.
A sua cadete Sílvia, de 17 anos recorda o "primeiro acidente" aos 16 anos: "marcou-me ver o carro ao contrário e ver as pessoas todas ainda lá dentro". E até Ana, de 13, já tem aventuras para contar: "Fomos chamados para atender uma senhora que se tinha sentido mal porque o marido tinha morrido na véspera. A filha estava muito agitada e caiu-me nos braços".
Duarte Caldeira, presidente da Liga Nacional de Bombeiros, quer "desmistificar a ideia de que se utiliza mão-de-obra de jovens por falta da de adultos". E está convicto de que "está em vias de extinção a utilização de jovens para tarefas para as quais não têm idade, nem enquadramento legal". Mas admite que "não possa excluir a existência de más práticas em alguns corpos de bombeiros".
PONTOS DE VISTA
"Os menores de 18 anos não devem, nem podem, ser voluntários", afirma a presidente do Conselho Nacional para a Promoção do Voluntariado. Elza Chambel garante que não deixaria as suas netas de 9 e 13 anos sequer participar nas acções de recolha de alimentos do Banco Alimentar, pois existe o "problema do risco". A lei indica que só podem beneficiar do seguro social voluntário os maiores de 18 anos. E lembra: "A gente mais nova é muito voluntariosa, extremamente impulsiva e sem redutores mentais" e "somos muito facilitadores".
O DL nº247/2007 diz que o universo de recrutamento de infantes é feito entre os 6 e os 16 anos e o de cadetes entre os 16 e os 18 anos. Uns e outros integram a apólice de seguros do quadro de reserva e não podem ter actividade operacional. As escolas de cadetes e infantes têm uma função lúdica ligada à cultura de protecção e socorro. Tal como nos programas de voluntariado do Instituto Português da Juventude, a adesão de menores de 18 anos implica a autorização dos pais por escrito.
"Há comandantes de bombeiros que deixam passar estas situações (de cadetes a fazerem serviços operacionais) porque não têm homens suficientes. O voluntariado está em crise", argumenta Fernando Curto da Associação de Bombeiros Profissionais.
Expresso

2 comentários:

  1. PARA ME MANTER INFORMADO DAS NOVIDADES DE BOMBEIROS COMO FAÇO TODOS OS DIAS, PASSEI POR AQUI E ASSIM QUE LI ESTE POSTE ATÉ ME DEIXEI RIR. CAROS AMIGOS VEJAM BEM O QUE RESPONDE A ANPC PERANTE TAL CASO...

    ""...Questionada pelo Expresso sobre os casos de violação à lei, a Autoridade Nacional de Protecção Civil (ANPC) esclarece que, desde que a lei entrou em vigor, "não recebeu quaisquer denúncias, nem foram detectadas quaisquer situações anómalas". E que, "se o comando distrital tivesse conhecimento de situações, seriam de imediato tomadas as medidas adequadas ao esclarecimento dos factos e respectivo procedimento, junto de quem tem a responsabilidade de zelar pelo cumprimento e aplicação da legislação"...""

    POR AQUI SÓ PROVA QUE A ANPC ANDA APANHAR BANANAS. TODOS NÓS SABEMOS QUE ISTO SE PASSA HÁ ANOS E POR ISSO PODEMOS VER NOS NOSSOS CB'S. EU FALO POR MIM POIS COMIGO ACONTECEU O MESMO E JÁ TENHO 23 ANOS DE BOMBEIRO. ISTO SÓ PARA FAZER VER QUE HÁ MUITO TEMPO QUE SE PASSA DISTO...

    A ANPC NÃO SABIA OU NÃO QUER SABER?

    POR AQUI SE PODE VER COMO ANDAM OS SENHORES QUE NOS DEFENDEM, PENSAM ESTAR DENTRO MAS ANDAM DE FORA MUITO POR FORA DOS ASSUNTOS DE BOMBEIROS.

    E OS COMANDANTES NÃO DENUNCIAM ESTAS SITUAÇÕES PORQUÊ, PORQUE LHES DÁ IMENSO JEITO POIS HÁ CB'S QUE NÃO TÊM ELEMENTOS MAIS VELHOS E VALE-LHES O PESSOAL MAIS NOVO QUE NESTE CASO SÃO MENORES.

    EM SÍNTESE:
    -POR AQUI SÓ PROVA QUE OS COMANDANTES QUE NÃO DENUNCIAM ESTES CASOS É PORQUE LHES INTERESSA...
    -POR AQUI SÓ PROVA QUE OS CODIS NÃO ANDAM NO TERRENO JUNTO AOS BOMBEIROS POIS VERIAM QUE HÁ MUITA MALTA NOVA NO COMBATE AOS INCÊNDIOS E A FAZER ECIN'S MUITAS VEZES ESCALADOS COM NOMES DE OUTROS CAMARADAS SÓ PARA TAPAR A VISTA AOS CEGOS...
    -POR AQUI SÓ PROVA QUE O COMANDO DISTRITAL ANDA NO MUNDO DA LUA OU ENTÃO FECHA OS OLHOS COMO DE CEGOS SE TRATASSEM...
    - POR AQUI SÓ PROVA QUE ALGUÉM ANDA A MENTIR E MUITO, PORQUE NÓS QUE ANDAMOS NO TERRENO, MUITAS VEZES APENAS COM A QUARTA CLASSE VEMOS TUDO E OUTROS QUE SÃO DOUTORES NÃO VÊM OU FINGEM NÃO VER.

    E ASSIM VAI O MUNDO DOS BOMBEIROS, DEFESO POR PESSOAS QUE VIVEM ATRÁS DE UMA SECRETÁRIA... AINDA IRÁ SER PIOR!

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  2. grande parte dos bombeiros de verao ecin's sao miudos em ferias escolares...

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